terça-feira, 10 de abril de 2012

No fundo afundo. Do raso, renasço.


Se existe um instante onde todo por onde começa a vir, esse instante se apresenta como um fatídico ensaio sobre sentar entre as próprias farpas. Ser humano é ter a capacidade de renascer e encontrar luz e trevas dentro de si. Glorioso é quando o peito afunda e afiado na escuridão finalmente encontra a luz que o permeia. A casa ainda está cheia de larvas dos maus presságios. O espelho espatifou no chão em mais de mil pedaços abertos e os cacos permanecem refletindo faces monstruosas, incompletas, disformes e que mesmo que irreconhecíveis são assustadoramente suas. A gente senta, grita, escorre e se pergunta: Como podemos nos assustar com o nosso próprio Eu? e a resposta vem: Ninguém disse que casulos não eram escuros e ninguém prometeu que depois dele, as borboletas viveriam mais de vinte e quatro horas. Não adianta esconder, não adianta fugir. É atormentador colher os próprios penares. É assustador tatear o próprio obscuro e ninguém sai ileso disso no mundo. Parece que a vida nos assiste de mansinho, bem baixinho e milimetricamente atenta para lançar bem na fratura exposta aquilo que mais temíamos pelo potencial de entredilacerar-se. Parece cruel, parece castigo. Mas é dádiva. Não há nada mais poderoso do que a dor. Não há nada que transforme mais a vida e o caráter do que essa mania do destino de mexer lá onde dói mais. Não é sadismo, é poesia. É capacitação. É oportunidade única de renascer. O que dói é que transformar-se pode estar intimamente ligado a funerais irreversíveis, que sim, serviram para que fazer renascer fosse ainda mais belo. Mas que sabe, estão lá dentro. Gritando íntimo: Se você não tivesse tanta escuridão naquele momento dentro de você, teria a luz mais linda da sua história. Ah sim, que luz. Luz infinita que iluminaria tudo por dentro. Acredito que Deus nos dá longos abraços quando percebe que usamos nosso potencial de ser luz e sim, vou iluminar por ai. Amor transforma. A sensação é de morte sem essa luz e a vontade de acordar de um pesadelo permanece, mas renasci. E a gente não pode passar a vida inteira sem perceber que é a dor que nos faz construir felicidade autêntica. Vou amar de todo o meu coração e rezar noites a fio pra que a luz que tece meus dias não partir e meu peito escurecer. Porque agora, sou luz. E luz, é você. Quando alguém é maior que o mundo, a gente se sente meio sem chão, sem casa. Mas saiba, você é meu lar. E ali, bem perto da curva do seu ombro direito e da imensa paz infinita do pulsar do seu peito é onde mora meu casulo, meu castelo, meu porto vivido em par.
Vem, a luz tá acesa.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Apague a luz



Tatear as próprias trevas entre as cavas nos proporciona a
expansão da consciência. Tomar-se num só gole sem vestígios de mistério sempre foi para a humanidade uma espécie de tabu. Se voltarmos a natureza primitiva dos míticos "Adão e Eva", aos vestígios do inconsciente e até mesmo aos estudos do desenvolvimento da consciência humana, podemos analisar que a descoberta do "eu" é o início de uma metamorfose dolorosa e magnífica. Podemos observar esta característica humana nas mais diversas etapas e situações existenciais. A infância é o grande palco, afinal nesta etapa não sabe-se o que o "eu" representa e a sensação mais comum é a de ameaça, principalmente em contextos onde seus pais ou símbolos de proteção não evidenciem alguma presença. Lembra do seu primeiro dia na escola? ou naquela apresentação onde só quem passava segurança eram os rostos mais familiares?
Todos nós já passamos por situações deste porte, inconscientemente e conscientemente. E isso não muda muito durante a fase adulta. Quando nos conectamos dentro de um relacionamento, dependendo do grau da fusão entre um indivíduo e o outro, ao haver um rompimento, a sensação pode ser de que o "eu" foi embora junto. O vazio ecoa pela existência e ai inicia-se o processo de conscientização do tênue "eu". Lidar com "o outro" é um desafio desde o início da nossa psique.
Quem nunca teve a sensação, ainda que durante a infância de que a luz é o símbolo protetor?
É ai que mora o risco. A luz não nos ilumina o que há de sombrio. É preciso despir-se do medo do silêncio e do oculto. Quantas vezes estamos sozinhos em casa e ligamos a televisão desmotivadamente, só pra sentir uma presença mesmo que invisível? Quantas pessoas morrem sem experimentar o poder da meditação? Será a consciência uma dádiva ou um sofrimento?
A consciência é o único caminho para o real. A consciência é o único rumo que nos movimenta para fora. A consciência nos faz ser o "eu" em sua mais excêntrica esfera. Uma das consciências mais importantes da vida é a de que não devemos nos apegar aos papéis que vivemos, nem as coisas que possuímos. Devemos nos apegar às coisas permanentes, essenciais, imateriais. Devemos descobrir o que nos transcende e transborda. Compreender-se é reinventar-se. Reinventar-se é a única maneira que mantém a vivacidade e a consciência no presente pleno. O ego precisa de flexibilidade para apropriar-se ao momento de modo real.
Feche os olhos e permita-se sentir medo. Permita-se sussurrar seus cantos fantasmagóricos. Grite sua mais pura essência selvagem. Descubra o seu "eu" no escuro da consciência mórbida porque ao acender a luz, a metamorfose dará o tom que guiará a sua existência superiormente interessante: A existência daquele que livrou-se das falsas roupagens da covardia e atirou-se na miragem do falso abismo da consciência sem medo de nunca mais voltar para a casca comoda.
Quem enxerga no escuro, não teme ao claro.